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luís soares

Blog do escritor Luís Soares

Confissões e vocações.

Como sempre nestas coisas, começo pelo disclaimer, sou funcionário da Portugal Telecom. Dito isto, este post vem a propósito da fusão hoje anunciada entre PT e Oi. A Portugal Telecom assume sem margem para dúvidas (se ainda as houvesse), a sua vocação atlântica, lusófona, o que lhe queiram chamar.Ora isto, como acontece com estas coisas, pôs-me a pensar sobre o país, a sua história, o seu lugar no mundo e, para reduzir um bocadinho a escala, aquilo que a mim me move em particular.

Não é de hoje que Portugal é uma nesga de terra virada para o Atlântico, com o Mediterrâneo ao virar da esquina e a tentação europeia a chamá-lo por cima do ombro. Vivemos com estas três vocações a tentar despedaçar-nos. Antes de sermos país, o Mediterrâneo invadiu-nos, depois de uns séculos de magra tentação europeia virámo-nos para o Atlântico e demo-nos bem. Mas a riqueza deu-nos para o desperdício e as embaixadas com elefantes. Fomos para o mar mas queríamos era ser europeus. À lenta desagregação do projeto atlântico sucedeu a marginalização do projeto europeu por via de um bolorento "orgulhosamente sós". Chegámos tarde à Europa, comemos tudo o que nos deram como criança esfomeada que éramos e apanhámos com a crise na mesma medida em que nos tínhamos entregue. E espantamo-nos que quem tanto nos dava, agora tanto nos peça. Não há almoços grátis.

Perdoem-me o resumo cabotino acima mas o que eu queria dizer é que entre as empresas portuguesas, a Portugal Telecom é das poucas que percebeu que há que ser do mundo para ser inteiro. E há que ser inteligente ao fazê-lo. Ninguém nos leva a sério no norte do mundo? África continua o seu percurso difícil? Vamos então para o Brasil e em força. Seja. Parece-me um dos poucos caminhos que nos resta na globalização. E naquilo que conseguimos fazer, a hipótese de pertencer a algo maior que a nesga de terra.

A minha dúvida é mais pessoal. Cresci com a ambição da Europa e da civilização europeia, uma questão geracional e recorrente no país. Fui educado sobretudo na cultura do hemisfério norte e nunca cheguei a ser cidadão do mundo. Nunca viajei abaixo do equador. Apaixonei-me pela literatura anglófona, pela civilização ocidental e os seus cânones, a sua ambição, triunfo e decadência. Alguns piscares de olhos ao sul sempre dei, sobretudo por via da música. Mas por via da música, a todo o lado dou piscares de olho.

Sou muito português, nesta Lisboa sempre aconselhada a não ser francesa (ou inglesa ou catalã ou seja o que for). Nunca quis emigrar e tenho cada vez mais amigos emigrantes. Trabalho desde hoje numa multinacional com ambições globais. E pelo país, saúdo a lucidez do movimento. Por mim vou continuar a trabalhar, ler, escrever, ver filmes, ouvir música, estar com amigos onde quer que estejam. O resto logo se vê.